sexta-feira, 25 de março de 2011

um dia pensei que o rádio estava tocando

Mas não estava. Eu estava apenas sonhando. E naquele sonho eu podia enxergar belonaves espaciais que voavam a mais de quinhentos mil megalometros por milésimos de segundo. Elas eram tão rápidas que não era possível enxergá-las, mas eu conseguia. Por alguns segundos eu conseguia. E delas, as belonaves, eu ouvia as melodias que não poderia distinguir se eu não tivesse sido treinado arduamente na técnica de pegar mosquitos no escuro. Podia pegá-los com a língua se eu quisesse. Bastava me concentrar no vento ventado pelas asas microscópicas, mas ainda assim, tinha que me concentrar meio joule a mais e ouvir os pensamentos trocados entre elas. Assim podia ouvir também as belonaves. Que apesar não poderem ser vistas, eram duma beleza magnifica. Com grandes asas emplumadas, sua carcaça era com se banhada no mar de bronze, suas turbinas soltavam luzes multicoloridas capazes de entorpecer não somente as mentes, mas os corpos de quem prestasse um minuto a mais de atenção. Por trás da esquadrilha de belonaves, se encontravam corpos celestes de uma magnitude imensurável. Eram como sóis coloridos, com mais cores que um arco-íris, imagine um pôr-do-sol de cada cor, foi o que pude ver naquelas tardes em menos de duas horas. Quando anoitecia era como se as luas, conversassem, uma triste, uma feliz, uma orgulhosa e uma tímida, todas no céu ao mesmo tempo. E no chão tinha o mar e os peixes, eles traziam pequenos corais nas costas, dessa vez duma só cor. Eram todos prateados. Mas com diversos brilhos diferentes. Olhando do alto parecia que estava chovendo de lado. Gotas de frio prateado. Ao meu redor tinha essa redoma de seiva e carinho, nesses tons alaranjados, muitos deles, alguns não conseguia reconhecer, ela expandia minha percepção das coisas e dobrava meus sentidos, dos cinco passei a ter dez. Quando pensei que o rádio tocava, parecia até Tchaikovsky, foi quando pensei que podia estar sonhando e pensei que acordei. O rádio estava tocando a abertura de mil oitocentos e doze. Depois disso nunca mais soube se estava dormindo ou acordado.

terça-feira, 22 de março de 2011

quando os cascos de tartaruga deixam de ser vermelhos


- ...as coisas estão ficando estranhamente bonitas
- uououououo!
- sabe, eu sempre achei que não tinha amigos
- a-ha!
- sempre fui mais de ficar por aqui sentado, jogando... e nunca me dei conta que você também esteve sempre aí, do outro lado.
- it's me, Mario!
- e que apesar de você estar aí e eu aqui, eu sentia que às vezes estávamos realmente juntos, correndo por aí, às vezes até voando
- uh...uh...uh...
- e que eu na verdade sou você e você sempre foi eu mesmo
- ...
- nós, nós dois, somos a mesma pessoa!
- it's me, Mario!

Por um acaso do destino ele nasceu Mario.

E por coincidências da vida, aos 6 anos, jogou Super Mario. E por habilidade nata, ele jamais perdeu uma vida em Super Mario. Por coisa incompreensíveis um dia ele achou ser o próprio Super Mario.

Cresceu guardando esse segredo pra si. Ele e o Super Mario estavam ligados, sabe-se lá por quê. Talvez pelo seu irmão mais novo ter nascido Luigi e pelo seu primeiro amor ser uma loirinha que vivia de vestido rosa. Isso causou algumas complicações ao ele ter adquirido uma estranha excitação ao matar tartarugas pulando em cima delas.

De certa forma isso era bom pra ele. Quando ele olhava pras estrelas, se sentia invencível. Ele sabia que se um dia pudesse alcançá-las seria invencível de fato. Isso tornou-o uma pessoa com extrema autoestima. 

Deu pulos de alegria quando seu bigode começou a nascer. Era um vitorioso.

Foi então que num dia normal ele resolveu jogar o primeiro Super Mario mais uma vez, como já tantas vezes tinha feito. E não se sabe se por acaso do destino, por pura distração ou por coisas que não entendemos. Ele caiu no primeiro abismo do primeiro mundo. Ele morreu.

Seu mundo naquele instante se quebrou. O frio percorreu a espinha toda, eriçando cada pelo da sua nuca. Ele estava esperando pela morte. A qualquer instante. Sabia que eles estavam ligados. Conectados por algo muito maior. Mas ele morreu. E ele continuou vivo. Não estava entendendo muito bem. Tudo que ele acreditou durante a vida era mentira? Não estariam eles ligados? Seria possível?

Mas ele só entendeu tudo quando viu o Mario de volta na tela, como se nada tivesse acontecido. E aí então veio o estalo - Ele nunca tinha se tocado se caso ele morresse de verdade, voltaria, com uma nova chance. Se sentiu melhor do que nunca. Zerou o jogo mais uma vez.




sexta-feira, 18 de março de 2011

quando a música para

Nem sei quanto tempo passou. Parece que foi tanto, ao mesmo tempo em que parece que foi ontem. Acho que a sensação é essa mesmo. Já ouvi muita gente falando assim. Quando comecei com isso tudo imaginei que pudesse ser algo parecido. Mas também admito que me surpreendi muitas vezes. Dum jeito bom e dum jeito ruim também. Me divertia a cada vez que ouvia por aí que eu ia acabar com tudo. Será que eles nunca pensaram que não havia um motivo real pra eu fazer isso? Em todo esse tempo não conheci nenhum criador que ficasse feliz em acabar com sua obra.  Um pintor jamais parou de pintar, um escritor nunca parou de escrever...

Mas a verdade é que música parou de tocar, já faz muito tempo. Está frio. Sentado aqui consigo perceber o último planeta parar de girar. Todos eles já pararam. A estrela que sobrou está tão fraca quanto os pontinhos que víamos no céu a noite. As pessoas já acreditaram fervorosamente em mim e já acharam que eu não existia por muito tempo, voltaram a acreditar e depender de mim novamente e assim seguiu, indo e voltando. Eu jamais deixei de acreditar nas pessoas. A última estrela está quase apagando. O universo está escuro. Foi bom. Foi ótimo na verdade. É a hora de começar tudo outra vez. Estou feliz. Será ótimo. Mais uma vez.